Translator

terça-feira, junho 20, 2006

Reavivando a memória

Fuçando no meu outro blog, que serve de back-up para este, achei um artigo da Maria Helena Rubinato de Souza (que deve ser um pseudônimo de alguém importante) que entendi ser importante republicar, pois embora escrito em agosto de 2005(quase um ano atrás), continua atual graças às peripécias apedêuticas atuais. Serve para reavivar a memória dos meus 3 leitores e mantê-los alerta tendo em vista a aproximação das eleições. Leiam a seguir:

"O herdeiro da Emília
Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa

Não sei se os leitores do blog do Noblat leram o excelente artigo de Ferreira Gullar, “Lula foi mesmo traído?”, publicado na ´Folha de São Paulo`, domingo, 21 de agosto. Com a lucidez que só os poetas têm, Gullar desmonta item por item a tese, defendida por muitos, que Lula não tem responsabilidade pelos desmandos de seu governo e do PT. Tese que o próprio Lula desfila pelo país a fora. O artigo termina assim: “Por isso mesmo, no ambíguo discurso em que pediu desculpas à nação, Lula, ao dizer-se traído, evitou citar nomes. Sabe muito bem que não pode fazê-lo. Sua responsabilidade em tudo o que ocorreu é indiscutível. Nem por isso defenderia a tese do seu impedimento”.

Concordo com o poeta. Impedimento não. Creio que devemos aprender a respeitar os votos que depositamos nas urnas e arcar com as conseqüências. Não podemos continuar a dizer: “Papai, não gostei do brinquedo. Compra outro?”. Temos que agüentar até o fim do mandato e na próxima eleição, votar melhor, mais conscientes e menos influenciados pelos lindos programas de marqueteiros proficientes na venda de produtos industrializados.

Mas, e se o presidente estiver sendo sincero? Se for realmente inocente das maracutaias que o rondam?

Ao assumir a Presidência, Lula, apesar de já não ser operário há muito tempo e de estar levando uma confortável vida de pequeno-burguês, deslumbrou-se, o que é muito natural, com as maravilhas oferecidas ao detentor do poder. Vamos e venhamos, é para tontear qualquer um: helicópteros e carrões; possibilidade de viajar para onde quiser, levando os amigos que quiser, no avião que escolheu; casas (o Alvorada e o Torto) fartas, comida, bebida e charutos da melhor qualidade, com campinho para futebol, churrasqueiras de luxo, piscinas, academias de ginástica, empregados para servir a ele e aos seus familiares 24 horas por dia; roupas sob medida à vontade, cabelos bem tratados, dentes recapeados, a pele bem cuidada, olha-se no espelho e nem se reconhece; trata os grandes do mundo de igual para igual; dizem que ele é o máximo, um operário que venceu; os tradutores simultâneos enchem seus ouvidos com os elogios que lhe são dirigidos em diversas línguas; os intelectuais da Pátria Amada se curvam diante dele, garantindo-lhe que a falta de instrução não é um impedimento, é antes um adendo, “o saber de experiência feito”; seus áulicos, conhecedores da fábula “O Corvo e a Raposa”, pedem-lhe que cante e assim pegam o queijo e... o resto é o que estamos vendo.

Vamos ser justos: você não piraria? Pois é.

Só que, de repente, a conta começa a chegar e o presidente fica inteiramente atônito. Ele é inocente, ele não fez mal a ninguém, ele só fez elevar o nome do Brasil, ele fala ao telefone com o Bush, com o Chirac, o Brasil vai presidir a OIC, o BID, sentar no Conselho de Segurança, seus assessores garantem isso tudo. O que é que está acontecendo? Fica inteiramente desarvorado e como qualquer um de nós quando em perigo, corre para o colo da mamãe, que no seu caso é o povo, representante direto de D.Lindu, que não está mais entre nós.

E aí começam essas viagens pelo interior do Brasil, os discursos estrambóticos, o “vão ter que me engolir”. E o eco das palavras de mamãe, senhora analfabeta de vocabulário altamente sofisticado: “meu filho, não perca nunca a esperança, persevere sempre e ande de cabeça erguida porque a verdade prevalecerá”. Fala, num discurso inflamado, que nada o impedirá de viajar por este país, para inaugurar as obras que realizou: “pontes, viadutos, hidrelétricas, estradas”. Viajando de avião ou de helicóptero, debocha de seu antecessor, dizendo que não sabe o que ele fazia, 8 anos e não consertou um quilômetro de estrada! Inaugura pontos de iluminação em Amaralina, fábrica de bolas e camisetas esportivas em Cidade Tiradentes, diz ao povo reunido à sua volta, transportados em ônibus fretados pelo PT, que o colesterol faz mal à saúde, que devem tirar o traseiro do sofá e fazer um exercício, jogar uma bola; ao lançar o Programa Nacional do Esporte, faz questão de dizer que o projeto não se dirige apenas aos atletas, não. Serve também para o cidadão comum e explica: “A pessoa acorda cansada, às 6hs, e vai para a esteira dar uma caminhada reclamando de tudo, de mau humor. Depois de 20 minutos, está se sentindo bem, mais alegre. É o que acontece comigo todos os dias”.

Esteira em casa? Cidadão comum? Mas tem mais.

Ele compara o exercício da Presidência à paternidade, dizendo que “o povo quer um presidente que converse com ele, com a tranqüilidade que uma mãe conversa com um filho, que um pai conversa com um filho. O meu trabalho de presidente não é apenas o de administrar a grande política de Brasília, é cuidar para que a família brasileira viva em harmonia, viva em paz. Que pai goste do filho, que filho goste da mãe e que juntos possam construir a base de nação livre e soberana que nós vamos consagrar no nosso país. Se a família não estiver integrada, se não houver harmonia entre pai, mãe e filho, se não houver harmonia entre todos aqueles que compõem a base da sociedade, que é a estrutura familiar, tudo mais fica difícil”.

O Brasil em estado de choque com as revelações diárias de corrupção, vindas de todos os lados, o PT se apoucando, a base parlamentar do governo desfeita, o Congresso parado, e o presidente viajando e discursando, viajando e discursando. Haja palanque. Haja ônibus fretados. Ontem, 24 de agosto, o presidente em cerimônia de entrega de ambulâncias para o SAMU declarou que “em matéria de saúde os outros países do mundo podem vir ao Brasil e aprender o que é saúde”. Haja Deus!

Diante desse seu palavrório, dessa fuga da realidade, dos elogios ao Palocci por ter enfrentado a Imprensa, numa entrevista “firme”, “uma beleza”, fico, sinceramente, impressionada, e começo a ter dúvidas: será que ele não sabia mesmo de nada? Será que foi traído? Será que é de todo inocente?

Então, a alternativa é terrível. Trata-se de um caso para o Dr. Simão Bacamarte, em Itaguaí, que pode ser acessado através do bruxo do Cosme Velho. Ou então, e queira Monteiro Lobato lá do céu que assim seja, ele é o herdeiro legal da torneirinha de asneiras da Emília."

3 comentários:

Saramar disse...

Tunico, boa noite.
Importantíssimo o texto. Você reativou o que precisamos manter na mente de todos. Irei indicar a leitura do seu blog em meus grupos.

Beijos

Anônimo disse...

Realmente muito bom, muito bom mesmo!!!
Abs

Kafé Roceiro disse...

Excelente texto, amigo! Valeu...